32 - A Minha Melhor Versão
Eu nunca fui boa com palavras. Sempre fui melhor em escapar por janelas estreitas, deslizar entre sombras, em desaparecer por corredores. Mas ali, sentada ao lado dele, eu sabia que fugir não era mais uma opção. Era hora de enfrentar o que eu estava sentindo.
— Então... Como você me identificou? — perguntei baixo, quase sem o encarar. — Eu sempre fui tão cuidadosa em meus roubos... Desde o começo... você se aproximou de mim já sabendo que eu era a Gata?
Bruce sustentou o olhar com aquela calma que sempre me desarmava em nossas conversas sérias.
— Não foi tão difícil assim... — disse com a voz calma. — E descobri antes mesmo de você aparecer naquele leilão... mas eu tinha outros crimes para investigar, então só ia lidar com você depois.
A minha respiração ficou presa na garganta.
— Mas como?
— Você me beijou naquela noite, se lembra? — ele respondeu com um tom gentil quase imperceptível. — Foi através da saliva.
— Então você deixou!? — minha pergunta foi mais como uma declaração envergonhada. — Droga, eu devia ter imaginado que aquilo não foi por acaso, e por emoção... ou por sedução.
Senti meu rosto esquentar por causa disso. Que vacilo! Argh...
— Quando você apareceu no leilão, foi uma surpresa pra mim também. — ele continuou. — Eu não fazia ideia de que você usava o dinheiro que roubava, pra fazer doações... pensei que assim como os outros, usava para si, gastava tudo com compras...
A surpresa nos olhos dele não foi encenação aquele dia... Vi algo lá, mas não soube dizer o que era. Mas agora que ele está dizendo, parece ser mesmo a verdade.
— Eu nunca roubei por necessidade — admiti, encostando as costas no sofá. — Eu sempre gostei da adrenalina. Do autocontrole durante o planejamento dos meus roubos. E saber que o dinheiro podia ser bem usado... isso me fazia sentir menos errada na história. — suspirei antes de continuar. — Eu amo os animais, e queria ajudá-los mais, mas com os empregos que eu tinha, não eram o suficiente. Eu precisava de mais, precisava fazer mais-
— Eu sei — ele disse, interrompendo com gentileza.
Pisquei devagar, e ele repetiu:
— Eu sei, Selinne.
As palavras ficaram suspensas por um momento.
— Foi por isso que me aproximei de você e quis ser um amigo. Você não era como os outros. Nunca foi. E eu precisava te entender. Saber os motivos pelos quais você roubava. E talvez... encontrar uma forma de te ajudar a lidar com isso. Mas como um bilionário, um playboy que apenas se importa consigo mesmo e sua empresa, eu nunca seria capaz de te entender completamente.
— Então tudo que você planejou deu certo, você me entendeu. Me conheceu. — murmurei, num tom mais amargo do que eu gostaria. — Mas ainda assim... você me prendeu, e não sabe o quanto isso me magoou...
Vi a dor nos olhos dele, por um momento foi difícil me olhar... Assim como aquele dia no tribunal.
— Eu não queria fazer aquilo — ele admitiu. — Eu te ofereci ajuda. Mas você recusou. Você não queria enxergar que tinha cruzado uma linha fina demais, Selinne. E se eu não fizesse nada para te prender... os outros iam perceber que havia algo entre nós. Eles iam te transformar em um alvo. E eu não queria que isso acontecesse... Gotham não pode saber dos pontos fracos de ninguém.
Aquela parte doía mais do que eu esperava. Mas... eu entendi. Finalmente, entendi.
Baixei os olhos lentamente. A tristeza ainda pesava nos meus ombros, mas havia clareza agora.
— Você fez o que era certo... — eu disse, mesmo ainda sendo difícil admitir o quão errada eu estava. — "Isso é para o seu bem". E agora eu entendo as suas palavras naquele dia...
A mão dele tocou meu braço com cuidado. Um gesto pequeno, mas cheio de ternura em sua mão quente.
— Você nunca esteve sozinha — sussurrou. — Eu sempre cuidei de você desde que te conheci. E vou continuar cuidando... não importa o que aconteça.
Meu peito apertou forte ao ouvir aquilo.
— Enquanto você estava presa, usei toda minha influência como um Wayne para reabrirem seu caso. Assim que você apresentou uma melhora no comportamento... paguei sua fiança. E não pense que fiz por peso na consciência, ou para que você me devesse qualquer coisa. — ele alertou com sinceridade.
Olhei para ele, mas não consegui dizer nada. Um nó se formou na garganta.
Bruce recuou a mão devagar, mesmo meio hesitante.
— Eu vou entender se você não quiser mais nada comigo, mesmo assim. Se quiser seguir em frente sem olhar pra trás... mas, mesmo se fizer isso, ainda não estará sozinha. Eu não tenho a intenção de desistir de você.
Minha mente rodava com lembranças e sentimentos confusos vindo à tona. Os meus sentimentos todos embaralhados dentro de mim. Como se tudo fosse névoa e, ao mesmo tempo, estivesse absurdamente claro pela primeira vez.
— Eu... nem sei o que a gente tem de verdade — confessei com dificuldade de olhar diretamente para ele.
Bruce me encarou por um momento. E um silêncio denso preencheu o espaço entre nós. Mas ainda havia algo no jeito que ele me olhava, havia ternura, e esperança.
— Eu sempre vi você, Selinne. — disse ele. — O potencial que você se recusava a ver... sua melhor versão.
A forma como ele disse aquilo... me fez lembrar daquela conversa que tivemos há alguns dias atrás. Olhei de volta quando percebi o que aquilo significava. O que aquelas poucas palavras significavam.
— Sempre foi você. — Bruce se inclinou devagar, respeitando cada centímetro, como se perguntasse com o corpo se podia ir adiante. E eu deixei, porque estou pronta.
Nossos lábios se encontraram com hesitação nos primeiros momentos. Ainda havia vergonha, meu corpo tinha certa dificuldade em processar aquilo tudo. O nosso beijo foi real, doce e familiar.
Mas pela primeira vez, não lutei contra isso. Não fugi ou recusei sentir o que estava sentindo. Não afastei meus pensamentos e nem escondi dentro de mim o que sempre esteve lá, mas que eu recusava a demonstrar.
Sim, eu o amava.
E agora, eu conseguia aceitar isso com clareza. Mesmo que fosse difícil e de certa forma estranho... Eu estava pronta para outra mudança difícil. Aceitar o que eu sentia por Bruce.



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